segunda-feira, 16 de maio de 2011

A retirada do Brasil das Listas de Preferências Tarifárias da União Europeia: o que isso significa?



Recentemente vimos nos jornais que a União Europeia vai retirar o Brasil de suas listas de preferências tarifárias, mas o que isso realmente quer dizer? No que isso influencia o comércio brasileiro e a economia do país? 

Comecemos pelo começo. O que é um Sistema Geral de Preferências Tarifárias? Esse sistema foi criado em 1971 no âmbito da UNCTAD, Comissão das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento, por influência dos países subdesenvolvidos. O objetivo desse sistema era o de facilitar a entrada dos produtos de países em desenvolvimento nos mercados dos países desenvolvidos, mediante a concessão de tarifas mais privilegiadas para esses produtos que as constantes do GATT (Acordo Geral de Tarifas e Comércio), baseadas na cláusula de Nação Mais Favorecida. 

O SGP foi aclamado pelos países em desenvolvimento e, em 1979, na Rodada Tóquio do GATT, esse sistema foi incorporado às regras do Acordo mediante a Cláusula de Habilitação, o que permitia concessão de privilégios aos países menos desenvolvidos e uma exceção à Cláusula na Nação Mais Favorecida. A incorporação desse sistema a GATT tinha o objetivo de estimular o desenvolvimento e a produtividade dos países mais pobres mediante um sistema sem contrapartidas que duraria dez anos. 

Com o passar do tempo, no entanto, os benefícios do SGP começaram a ser minimizados. O sistema era estabelecido por listas de exceção, onde cada país subdesenvolvido tinha produtos específicos que teriam redução tarifária. Além disso, o sistema era baseado na discricionariedade dos países, ou seja, na livre vontade de concessão dos países desenvolvidos. O resultado foi limitado, pois os países desenvolvidos concediam benefícios, majoritariamente, para os produtos primários dos países em desenvolvimento, não privilegiando os países de maior valor agregado. 

O SGP foi implementado, mas, em função de seus resultados insuficientes, alguns países se reuniam em 1988 e criaram o SGPC, Sistema Global de Preferências Comerciais, que funcionava apenas entre os próprios países em desenvolvimento como um sistema de concessões tarifárias mútuas e irrestritas. Esse sistema foi uma espécie de tentativa para solucionar as limitações e as insatisfações geradas pelo SGP e é visto como um precursor do futuro sistema de Cooperação Sul-Sul. 

Apesar disso, no entanto, o SGP continuou a valer. Um dos continentes que mais se utilizou do sistema foi a Europa, a fim de conceder privilégios aos países menos desenvolvidos e tentar minizar as disparidades causadas pelo comércio internacional. Esse continente privilegiou as concessões às suas ex-colônias e aos Países de Menor Desenvolvimento Relativo (PMDR), como maneira de evitar o colapso econômico de tais economias. Em 1971 foi criado o Sistema dos Acordos de Iaundé e em 1975 dos Acordos de Lomé, que concediam as preferências a tais países. 

Esse privilégios às ex-colônias não impediu a adoção do SGP do GATT pela Europa e a formulação de listas de concessão aos demais países subdesenvolvidos; todavia, o continente europeu sempre direcionou mais esforços para os países de menor desenvolvimento. Em 1989 é criada a Zona Preferencial Comercial, que ampliava as vantagens comerciais para as ex-colônias e PMDRs além daqueles do SGP do GATT, e em 2000 foi criado o Sistema de Lomé 4 Cotonou, que consolidou ainda mais tais vantagens a esses países. 

O Brasil, país em desenvolvimento, se beneficiou do SGP durante muito tempo. Presente nas reuniões da UNCTAD que deram origem ao SGP, o país foi, por mais de 40 anos, constante das listas de preferências tarifárias de países desenvolvidos. Alguns críticos dizem que as concessões foram pouco vantajosas ao país, uma vez que a maioria dos produtos beneficiados eram primários ou tropicais, como ferro, soja, bananas. Outros dizem que esse mecanismo foi importante para incrementar a corrente de comércio do país e facilitar a entrada de nossos produtos no exterior. Seja como for, o recente crescimento econômico do Brasil e sua estabilidade economico-financeira fez com que o país recebesse um upgrade em sua categoria, e não mais fosse considerado um país menos desenvolvido. Com esse argumento, a União Europeia pretende retirar o país das listas de concessões tarifárias que facilitam a entrada de produtos brasileiros no mercado europeu. 

Além da retirada do Brasil, a Comissão da UE também vai retirar China, Rússia e África do Sul das listas de concessão, mas vai manter parte dos produtos da Índia. Esse ocorrido nos mostra duas coisas: a primeira é que a pujança econômica do Brasil, apesar de positiva, agora vai ser utilizada como motivo de redução de privilégios ao país, o que já era previsível; a segunda é que, de fato, a Europa continua em crise e a recuperação está lenta. Essas medidas  visam reduzir o escoamento de dinheiro europeu para outros países e estimular o consumo de produtos internos, ao encarecer os importados. 

Apesar dos cortes de privilégios, as concessões tarifárias aos PMDRs permanecerão, assim como às ex-colônias, no entanto, o rigor Europeu vem se refletindo também nas negociações entre União Europeia e Mercosul. Parece que a França, que exerce a presidência temporária da UE, não vê positivamente os acordos de livre comércio que vem sendo negociados desde 1995 e cujas negociações haviam sido retomadas em 2010. Um possível acordo de livre comércio facilitaria muito a entrada de produtos de todo o Mercado Comum do Sul na União Europeia, incrementando não apenas as exportações do Brasil mas de todos os demais países do Mercosul.

As consequências dessa retirada de concessões serão negativas para o Brasil, na medida em que a entrada de produtos brasileiros no mercado europeu será dificultada; no entanto, isso demonstra que o Brasil vem se tornando um país de economia forte e pujante e que começa a ser vista pelos países desenvolvidos de igual para igual. A solução as possíveis consequências negativas dessa mudança podem ser as negociações bilaterais entre o Brasil e seus parceiros, para incremento de comércio, e, claro, a modernização da produção brasileira. Na medida em que nossa produção se tornar mais competitiva, a entrada de nossos produtos em mercados diversos será consequência natural e não dependerá tanto de esforços por parte do governo.

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