domingo, 19 de dezembro de 2010

O reconhecimento do Estado Palestino pelo Brasil: um passo fora da cadência?



A recente notícia sobre o reconhecimento do Estado Palestino pelo Presidente Lula gerou polêmica, não apenas no Brasil, mas, também, em vários outros países. A atitude foi considerada por muitos jornalistas como sendo ousada e polêmica, uma vez que a ação reconhece o Estado Palestino e lhe atribui as fronteiras anteriores à Guerra dos Seis Dias, de 1967, uma das mais prejudiciais aos palestinos. Terá sido a ação brasileira tão ousada, ou apenas mais um passo no processo de aproximação do Brasil com os países Árabes?

O relacionamento do Brasil com os países árabes foi, desde sempre, pouco encorpado e bastante singelo. A falta de conhecimento mútuo entre as culturas era a principal causa da falta de proximidade, tanto política, quanto comercial e econômica. Apesar de uma tentativa de aproximação durante o governo Geisel e seu pragmatismo resposável, reconhecido pela diversificação de parcerias, não houve incremento duradouro nas relações entre o Brasil e os países daquele hemisfério. Apesar de uma aproximação política e econômica, o ponto principal das relações entre o Brasil e os países árabes permanecia sendo o comércio de petróleo, que naquela época ainda era fundamental ao desenvolvimento industrial brasileiro. Com os sucessivos choques do petróleo e a guerra do Afeganistão nos anos 70-80, as relações não avançaram, mas até mesmo regrediram.

A partir dos anos 90, com o fim da Guerra Fria e a abertura comercial brasileira, é possível acreditar que as relações Brasil-Países Árabes tenderia a incrementar-se; no entanto, dois acontecimentos marcantes no início dos anos 90 mudaram o rumo dos fatos. A Guerra do Golfo em 1991 e o recrudescimento dos conflitos árabe-israelenses dificultaram a situação naquela região. A Guerra do Golfo, iniciada em 1991, quando da invasão Iraquiana ao Kuwait, balançou as estruturas internacionais, especialmente no seio da ONU. A intervenção norte-americana na região, respaldada pelas Nações Unidas, consolidou ainda mais a hegemonia norte-americana na região e no mundo. O consenso na ONU e a organização em torno de tropas lideradas pelos EUA deram a esse país uma supremacia na região. O Brasil permaneceu à margem do conflito, negando-se a mandar contingentes ao Kuwait e pregando a solução pacífica dos conflitos, através de negociações e acordos.

As relações que o Brasil mantinha, comercialmente, com o Iraque foram problemáticas, na medida em que alguns brasileiros foram sequestrados naquele país, para serem usados como moeda de troca, nos anos 90. Isso fez com que, durante o início dessa década, as relações com os países árabes fossem minimizadas e muitas Embaixadas fossem fechadas, apesar da bem-sucedida missão Flecha de Lima (nome do Embaixador que conseguiu negociar a libertação dos reféns brasileiros). Além desse fato, que marcou o início do distanciamento brasileiro dos países árabes, a negociação dos Acordos de Oslo, que mantinham a paz entre Israel e Palestina, também foi marcante para demonstrar o afastamento brasileiro da região. A conferência de Madri de 1991, parte do Processo de Oslo, marca um novo posicionamento dos países árabes, ao redor dos Estados Unidos, que maximizava sua influência na região e minimizava a importância de outros atores, como a Europa, a América Latina e a Ásia. O não comparecimento brasileiro à Conferência é simbólico nesse sentido, ao mostrar que a região não representava grande atrativo à política brasileira.

Com o início do governo Cardoso, em 1995, é iniciada uma nova movimentação diplomática conhecida como diplomacia comercial, onde se inicia uma política de defesa dos interesses comerciais e econômicos nacionais. Com isso o Presidente optou por fortalecer as relações com o Mercosul e estabelecer uma relação menos tensa com os Estados Unidos. Dentre as atitudes marcantes desse período, está o apoio pacífico do Brasil à causa norte-americana de averiguar a produção de armas de destruição em massa no Iraque, em 1997; no entanto, apesar do fortalecimento das relações do Brasil com EUA durante a era Cardoso, a aproximação com os países árabes só se deu efetivamente a partir do final da década, especialmente ápós a crise do Mercosul em 1998, que levou o país a buscar uma diversificação de parcerias para incremento comercial, que de fato ocorreu.

Com o governo Lula a relação entre o Brasil e os países Árabes intensificou-se ainda mais. Após o 11 de setembro e às vésperas da invasão norte-americana ao Iraque, Lula é empossado. O Presidente, diante da situação, não apenas não apóia a intervenção norte-americana no Iraque, como se posiciona claramente contra isso. Em seguida, logo em seu primeiuro ano de governo, Lula organizou uma viagem presidencial a países árabes, como Líbano, Síria, Egito, Emirados Árabes e Líbia. Tal visita causou polêmica na medida em que deixou de fora países como Israel e Arábia Saudita, além de haver priorizado os países que possuiam menor importância comercial para o Brasil. Esse fato demonstra a propensão do governo Lula em diversificar parcerias de forma autônoma, buscando inserir-se internacionalmente através das múltiplas parcerias estratégicas, que não necessariamente as parcerias tradicionais. Outra atitude ousada de Lula foi a convocação da II CASPA (Cúpula América do Sul Países Árabes) atualmente chamada de Cúpula ASPA. A ASPA teve participação de diversos países árabes e aconteceu em Brasília no ano de 2003, quando foi publicada a Declaração de Brasília, contendo fortes demonstrações da reaproximação do Brasil com os países Árabes. A declaração não apenas condenou algumas ações do Estado de Israel como apoiou as medidas que vinham sendo tomadas pelo governo sudanês quanto à questão de Darfur, opondo-se a uma intervenção da ONU naquele país.

Apesar de uma posterior visita do Chanceler Celso Amorim à Israel, no final de 2003, para tranquilizar aquele país quanto à posição brasileira, é notória a maior proximidade do Brasil com os países árabes na última década. Nesse sentido, não é de supreender a declaração de reconhecimento do Estado Palestino pelo governo Lula, antes de chegar a seu fim. 

A questão quanto a reconhecer as fronteiras anteriores à Guerra dos Seis Dias também é simbólica. Essa guerra, ocorrida em 1967, se deu entre árabes e israelenses, após a retirada de tropas da ONU da peninsula do Sinai. Israel facilmente venceu os árabes, em apenas seis dias, e anexou os territórios egípcios do Sinai, as Colinas Golan da Síria, a Cisjordânia e Jerusalém, disputada também pelos palestinos. Com isso, Israel tornou-se o poderoso Estado que é hoje e deixou milhões de palestinos deslocados e refugiados, sobretudo na região da Faixa de Gaza. Apesar da proclamação unilateral de independência, em 1988, e da constituição da Autoridade Palestina em 1993 pelos Acordos de Oslo, a Palestina não é reconhecida como um Estado soberano, por não ter território próprio. A atuação brasileira recente se dá no sentido de tentar incentivar a uma repartição equitativa dos territórios entre Israelenses e Palestinos e a garantia de uma soberania ao Estado da Palestina. A concordância em reconhecer esse país com fronteiras pré-1967 se dá nesse sentido, de tentar garantir internacionalmente uma aprovação de um território que, oginalmente, era Árabe e foi perdido, em conflitos, para os Israelenses.

A meu ver, a atitude brasileira de reconhecer o Estado Palestino não foi um passo fora da cadência, se observadas as atitudes que nosso país já vinha tomando em prol de manter uma aproximação maior com países árabes. A questão é se isso não irá prejudicar as boas relações que o Brasil mantém com Israel, com quem, inclusive, o Mercosul possui acordos de livre comércio; porém, só o tempo dirá. A questão é que, apesar de um Estado de nascimento tardio, de nacionalismo tardio e de complexas relações políticas e sociais, a Palestina é hoje, para o Brasil, um Estado soberano.

Não sei se vocês conseguiram entender muito bem a situação. É um assunto complicado e que estou começando a estudar mais profundamente agora (deve ser notório) rs, mas espero que ajude, de qualquer maneira, àqueles que, como eu, não sabiam praticamente nada sobre essa situação. Espero em breve fazer um post só sobre o histórico da criação do Estado Nacional de Israel e a situação palestina.

Amanha vou pra casa!!! Uhul, essa foi minha última missão de estudos (em bsb) de 2010... Câmbio-desligo, e agora só volto a postar do Rio de Janeiro.

Um beijo a todos!


PS: Estou hiper feliz!


quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Os pais da diplomacia atual. Como chegamos até aqui?





Essa semana, estudando história e tendo as maravilhosas aulas do João Daniel, me perguntei quem seria o pai da atual diplomacia brasileira (se é que existe apenas um). Ao mesmo tempo em que o Itamaraty de hoje ainda possui muito de suas linhas tradicionais, advindas da época do Barão do Rio Branco, essa instituição, certamente, não é mais a mesma daquela época. Como assim?

Na República Velha, o Itamaraty era formado por gênios, como o Barão do Rio Branco, Joaquim Nabuco, e tantos outros. A base da política externa vinha da genalidade, do prestígio, das boas relações dessas figuras com a eltie governista. República das oligarquias, o poder era concentrado em poucas mãos, e o acesso ao poder acabava sendo algo muito restrito aos coronéis e aos indicados pelo governo. Após a Revolução de 30, com a Era Vargas, isso se modificou. Vargas quis incorporar ao governo outros grupos e camadas sociais, a fim de cooptar seu apoio. Para isso, é possível observar uma incorporação das reivindicações trabalhistas pelo Estado, um incremento nas políticas sociais, uma política de incentivo à industrialização, a fim de agradar os industriais, e uma política meritocrática, que agradasse às classes médias urbanas.

Essa política meritocrática é, atualmente, conhecida como "concurso público". Os concursos públicos são uma obra da Era Vargas, justamente para cooptar as camadas urbanas, que agora poderiam fazer parte do corpo do Estado, sentindo-se prestigiadas por isso. A fim de romper com a velha oligarquia do período anterior, Vargas não apenas acabou com as oligarquias e impôs interventores do governo central em seu lugar, mas acabou com a política do prestígio, dando lugar à meritocracia e a uma democratização do acesso ao poder público, mediante os concursos. A política varguista adaptou o Itamaraty à nova realidade que se aprentava ao Brasil: um país a caminho da industrialização, com amplos interesses no exterior e com uma sociedade urbana crescente. E assim a instituição adquiria as faces da nova socidade brasileira.

No entanto, se, por um lado, Vargas modificou a forma como o Itamaraty hoje funciona, por outro lado, ainda há muito da política "baronesca" no nosso MRE. É inegável que os concursos públicos deram nova cara ao Ministério e que essa política permitiu que pessoas de classes diversas, de origens diversas e de formações diversas tivessem acesso à formulação da política externa; no entanto, muito do prestígio da Era Rio Branco ainda permeia as relações do Itaramaty.

É sempre muito comum nos referirmos ao Itamaraty como uma instância distinta dos demais ministério; falamos da prova de admissão à carreira diplomática como algo distinto dos demais concursos públicos. A meu ver, isso se deve ao fato de que, por mais que a carreira tenha se tornado mais acessível, ela permanece elitizada. A carreira diplomática não é vista como uma carreira burocrática, mas como uma carreira de prestígio, de hierarquia, como à época do Barão do Rio Branco e de Joaquim Nabuco. É interessante observar como que, ao longo do tempo, tradição e modernização se misturaram de forma muito íntima, dando ao Itamaraty a face que hoje ele possui: de um lado, caras jovens, pessoas de múltiplas origens; do outro, a tradição da política externa, do respeito às autoridades, da solidez de uma instituição que possui mais de 100 anos de história e que tem suas raízes fincadas no Império.

Esse é o Itamaraty de hoje, uma instituição que se moderniza com o tempo, mas que permanece balizada em genialidade e tradição. Sua tendência é modificar-se ainda mais, com a nova política que vem sendo adotada com o governo Lula, de ampliar a base diplomática do Brasil. Com essa política de expansão da diplomacia, a tendência é que a carreira se renove, modernizando a instituição conforme a sociedade brasileira se modifica e adaptando-se à nova realidade do Brasil, que hoje em dia se consolida como potência internacional.

E eu serei parte dela, muito em breve!

Beijos mil,

Luiza

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Um sonho, 26 vagas e 14 dias



Poisé galera,

Sei que estou há um boooooooom tempo sem postar nada por aqui, mas a vida no último mês foi absurdamente corrida. Resumo da ópera: sou uma pessoa formada!!!! Finalmente acabou a faculdade para mim!! A monografia foi aprovada com louvor, passei com 10 em todas as matérias (apesar de ter inúmeras faltas) e deu tudo certo no final :) Vocês estão lendo o post da mais nova internacionalista do Brasil! rs.

Além disso, minha ausência também decorre dos estudos intensos para a prova do Rio Branco. Não sei se todos sabem, mas as vagas, que vinham sendo 100 nos últimos quatro anos, foram reduzidas para 26, neste ano. Yeah, babe, 26 vagas. O interessante foi ver a reação da galera que estuda comigo, no cursinho. Todo mundo pirou, começou a ficar desesperado, desanimado: não foi o meu caso, obviamente. Fiquei mais certa do que nunca de que esse  é o meu destino. Não existem 26 vagas? Ótimo! Uma delas é minha. Meu sonho é longo demais e certeiro demais para eu me abater com uma coisa dessas.

Confesso que comecei a dar o gás mais intenso da minha vida nos estudos. Tenho fichado uma média de 50 a 100 páginas por dia. Dividi minha semana em temas (Segunda: línguas; Terça: histórias; quarta: direitos, Quinta: PI e Geografia; Sexta: Economia...) e comecei a pirar o cabeção. Mas tem tem sido bom. Sinto que tenho absorvido muito conhecimento, e que as aulas vão me ajudar no resto. Tem que ser assim, pois chega um momento em que as aulas não irão acrescentar mais. Depois de certo ponto, é cair matando nos exercícios, e partir pro abraço.

Estou cansada, obviamente. Doida pra ir pra casa!!! Domingo finalmente viajo e passo duas semanas com a minha família, para então retornar a Brasília. Só terei duas semanas, 14 dias de férias. Nunca antes na história deste país eu tive férias tão curtas... Acho que nem são férias... Mas to curtindo assim mesmo. A simples ideia de que a cada página lida estou um passo mais próxima do MRE me anima muito.

Bom queridos, sei que nao acrescentei muito à vida de vocês com esse post, mas se eu puder dizer algo àqueles que me leem é: nunca desistam de algo quando vocês sabem que se trata do seu sonho. Com 26 vagas, com 1000, com apenas uma, eu permaneceria na busca pelo meu sonho, pela minha realização, e espero que seja assim com vocês. O Itamaraty e o nosso país precisam de pessoas engajadas, apaixonadas pelo nosso país e com objetivos.
Amem sempre aquilo que buscam fazer; façam sempre aquilo que buscam ser.

É o que venho fazendo...

Um beijo a todos os queridos,

Luiza